SEGREDOS DA MULHER MOÇAMBICANA - MISSÃO ÁFRICA PIEIA
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SEGREDOS DA MULHER MOÇAMBICANA




Na África Subsariana, a biodiversidade da natureza constituiu sempre um argumento poderoso e determinante para a sobrevivência e desenvolvimentodos povos, que encontram nesta generosidade a resposta para as mais diversificadas e elementares
necessidades, desde alimentares até curativas, passando pelas estéticas
e rituais.

Os segredos da sua especificação e utilização resultam do conhecimento e experiência popular acumulados ao longo de gerações,transformando-se na melhor herança destes povos. Raízes, tubérculos,ramos, cascas de árvore, folhas,pétalas, frutos silvestres, plantas,entre outras, são o vasto universo de soluções que a mãe-natureza
oferece, e que os africanos superiormente souberam adequar às solicitações do seu dia-a-dia.
E se o valor curativo e alimentar desta biodiversidade prevalecem nas suas preocupações, também o estético cedo se manifestou, particularmente nas mulheres,
que revelam uma grande auto estima com a sua apresentação e sensualidade. A sua pele macia a aveludada provoca no sexo oposto um fascínio incontornável, que deriva dos cuidados que as mulheres têm com a sua pele, a partir do uso do m’siro, um pó de origem natural sem qualquer aditivo à excepção
de água.

A origem do “pó mi lagroso ”


O m’siro, como é conhecido em Moçambique ou n’tunkuti, na província de Nampula, é extraído dos ramos de uma pequena árvore ou arbusto lenhoso e frondoso,com o nome científico de Olax dissitiflora (uma das 10 espécies existentes em África), da família das Olocaceae, que se desenvolve nas florestas ao longo do litoral e mais raramente em zonas ribeirinhas do interior. O pó branco resultante, e que é misturado com água, obtém-se através da fricção do ramo, já despido da sua casca, numa pedra característica a que os pescadores chamam de inchauri,dada a sua origem marítima e cuja localização só eles a conhecem.

Concluído este processo, seguese a sua utilização, espalhando aquela massa pela face ou pelo corpo, de acordo com os costumes, rituais ou alguns segredos inconfessáveis.

Os ritos e as crenças são factores de identidade que enriquecem a cultura moçambicana, e os pós oriundos de outras plantas, para além da Olax dissitiflora, fazem parte deste cardápio tradicional da etnia macua, como o extraído da árvore n’nhenhecure, abundante no litoral e na província de Nampula, particularmente nas regiões de Mossuril (Ilha de Moçambique), Angoche, Sangage e Catamoio, e também da mandioca, pela etnia maconde (makonde), na província do Niassa.


Os segredos do m’siro e os recados aos amantes

O m’siro, que não tem nenhum sentido mitológico, é utilizado como perfume, creme e bálsamo tradicional e atribui-se-lhe ainda faculdades terapêuticas, como são exemplos o combate ao surgimento do acne (borbulhas) e ao envelhecimento da pele. É de salientar que grandes marcas de produtos farmacológicos e de beleza ocidentais incluem nos seus cremes essências que derivam daquela espécie botânica, a Olax
dissitiflora.
As máscaras usadas pelas mulheres macuas (makwas), e que envolvem todas as classes
sociais e etárias, nas províncias de Nampula, parte da Zambézia, Niassa e Cabo Delgado, são ricas em simbologias e adequam-se às circunstâncias do quotidiano.

Algumas destas pinturas faciais orientam-se por uma leitura fácil no seio da comunidade local, mas indecifrável a outros olhos, e traduzem o momento do seu uso, como festas, cerimónias matrimoniais, rituais de preparação sexual e outros da
sua cultura, comprometimento, luto familiar, adorno exclusivamente estético, etc.

Mas há outras destas máscaras que vão para além do óbvio e sonegam recados muito par ticulares,só estendíveis entre as partes envolvidas, sendo exemplos disso quando as mulheres pretendem dar a conhecer ao marido o seu período menstrual, ou quando querem comunicar com os seus amantes para lhes transmitirem a sua disponibilidade ante a ausência do cônjuge. Também a morte do amante é manifestado nesta pintura de forma subtil de modo a que o marido não perceba.

De acordo com crenças e costumes, as mulheres do litoral estão proibidas de dormir
com a cara pintada de m’siro, pois acredita-se que poderão ser atacadas por fantasmas e espíritos maus.


Rituais casamenteiros e de iniciação feminina.

As jovens entre os 15 e os 18 anos, quando entram na chamada "segunda menstruação” (adolescência), são preparadas para a vida futura, como o casamento, pelas mulheres da família mais velhas, conhecidas como conselheiras (Anakamo).
Neste período de ensinamentos, a jovem tem de manter o corpo pintado com m’siro durante o dia, lavando-se à noite para o remover, e só é autorizada a conviver com crianças entre os 7 e os 14 anos, sendo-lhe vedado o relacionamento com os adultos. O objectivo deste rigoroso cumprimento visa salvaguardar a virgindade da jovem até ao dia do casamento e simultaneamente manter o seu corpo limpo, aveludado e sem borbulhas.
Já na parte final deste período decorre também o ritual para a iniciação sexual, uma cerimónia designada por Ossinkiya, e que tem como propósito explicar os segredos de sedução, onde o m’siro surge como argumento erótico e perfumado: o acto do coito, usando para isso instrumentos fálicos e alguma teatralização, e como tratar e lidar com o marido.
O m’siro convive na cultura moçambicana como aliado estético e curativo, cultor de segredos e ritos, ou seja, como referência incontornável da sua identidade.
A mulher moçambicana é um misto de segredos e sensualidades, cujas pinturas lhes valorizam a profundidade do olhar e lhes emprestam o desejo do efémero feminino.
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texto e fotos / text and photos Paulo Pires Teixeira - Revista de Bordo da LAM Infligh Magazine - INDICO / Série II, N 40, 2009 - Maio/Junho
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